domingo, 2 de março de 2008

Por que nos mutilamos?


Por que nos mutilamos?

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Sou a favor de recursos, não para enganar o tempo, o que em geral acaba em resultados desfavoráveis e patéticos, pedindo sempre mais e mais intervenções, mas para abrandar, eventualmente corrigir. A fim de que a pessoa, homem ou mulher, se sinta bem na própria pele. Não para que aos 60 a gente pareça ter 30 anos, e aos 80 viva a melancólica ilusão de ter 50.

Não é a juventude que interessa, mas a felicidade e a alegria. Olhar-se no espelho e poder dizer: bem, esta sou eu, aqui está a minha história, o que for excessivo vou corrigir, mas não quero ser uma adolescente eterna, a não ser que minha alma permaneça infantilóide.
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A angústia por manter-se jovem muito além dessa fase pode levar aos maiores desatinos. Como os modelos que se nos apresentam em nossa cultura superficial indicam que o bom é ter sempre 15 anos, se não tivermos alguma bagagem interior (o que inclui a cultural) para remar contra a correnteza, em breve faremos parte da legião de mutiladas, as quais têm pouco delas mesmas, peles fanadas expostas em decotes ousados de precários vestidinhos.
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Uma maturidade tranqüila e uma velhice elegante são mil vezes preferíveis à caricatura em que nos tornamos na busca do paraíso perdido, que é também uma ilusão. Pois a juventude nunca foi a melhor época da vida nem a única época interessante, embora possa cintilar e ferver mais.

A cada fase da vida seu próprio encanto e, claro, suas próprias dores. Então, quem sabe a gente – homens e mulheres – procure gostar de si um pouco mais, trocando a fatal tentativa de negar o tempo por saúde, equilíbrio, beleza real e alegria, que fazem um bocado de falta neste mundo nosso.

(Lya Luft – Ponto de Vista - Veja de 05/03/2008)

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